Trabalho escravo vai aumentar com o fim do Ministério do Trabalho
O fim do Ministério do Trabalho (MT), anunciado pelo presidente eleito,
Jair Bolsonaro, vai prejudicar a fiscalização das condições de trabalho,
especialmente os análogos à escravidão, e o acesso a serviços e benefícios dos
trabalhadores.
Esta é a conclusão da CUT, do Ministério Público do Trabalho (MPT), da
Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra) e do
Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (SINAIT).
Para o presidente da CUT Vagner Freitas, o presidente eleito quer tirar
os direitos dos trabalhadores e das trabalhadoras contidos na CLT. Na prática,
segundo Vagner, o ilegítimo Michel Temer já vinha prejudicando a fiscalização
ao reduzir o número de fiscais do trabalho, e Bolsonaro, ao mudar o status de
ministério para secretaria, reduz também a estrutura e o poder de fiscalização.
Propor o fim do ministério do Trabalho é demonstrar que não tem nenhum
apreço pelo trabalhador- Vagner Freitas
"Isto vai aumentar o trabalho escravo que prejudica milhares de
trabalhadores e trabalhadoras em todo o país. Além disso, as empresas vão
perder competitividade porque a Europa e os Estados Unidos não compram produtos
de empresas que utilizam mão de obra escrava", diz Vagner, que conclui: "Serão
prejudicados os trabalhadores e as empresas".
Para Vagner, o debate sobre o fim do Ministério do Trabalho tem de ser
levado para o Congresso Nacional, mesmo que Bolsonaro queira governar o país
sem as instâncias tradicionais previstas pela Constituição.
"Ele quer falar diretamente com o povo via WhatsApp. Ele quer enganar o
povo novamente com balões de ensaio a notícias falsas como fez nas eleições",
alerta o presidente da CUT.
Já o Ministério Público do Trabalho (MPT), órgão independente que atua
em parceria com o MT e os auditores fiscais do trabalho, reforça que ´é muito
preocupante a ideia de se extinguir o Ministério do Trabalho´.
O procurador geral do MPT, Ronaldo Fleury, diz que "se o Brasil não
tiver uma política efetiva de combate ao trabalho infantil e trabalho escravo,
as empresas vão perder mercado internacional", como disse o presidente da CUT.
"Hoje, a política e a palavra de ordem é compliance, e a Europa,
principalmente, exige que o Brasil tenha política de compliance - uma política
de combate ao trabalho escravo e de combate ao trabalho infantil", afirma.
Nos preocupa muito, preocupa os trabalhadores, deve preocupar os
empresários também, além do próprio governo- Ronaldo Fleury
E os números mostram a importância do trabalho conjunto de fiscalização,
entre o MPT e auditores fiscais do trabalho. Somente no ano passado o MPT
recebeu 1.183 denúncias de trabalhos análogos à escravidão. Desse total, o
órgão realizou 235 Termos de Ajustamento de Conduta (TACs) com empresas
denunciadas e ajuizou 87 ações.
Fleury conta ainda que o índice de acidentes do Brasil é muito grande.
São mais de R$ 75 bilhões gastos nos últimos cinco anos decorrentes de
afastamentos em razão de acidentes e adoecimentos do trabalho e mais de R$ 350
bilhões com dias de trabalho perdido por conta desses acidentes.
"Existe um ônus muito grande para a própria sociedade brasileira; para o
governo, que tem que assumir esse gasto com a Previdência, com o afastamento da
Seguridade Social; e também para as empresas".
"Espero", diz o procurador-geral do MPT, "que o governo eleito reveja
essa posição e que tenha o cuidado com a parte da fiscalização do trabalho, com
as políticas públicas referentes ao mundo do trabalho, principalmente agora que
nós temos uma realidade de mais de 12 milhões de desempregados, isso sem contar
os milhões de desalentados no país".
A fiscalização das condições de trabalho também preocupa o presidente da
Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra),
Guilherme Feliciano.
Projeta-se um possível enfraquecimento da fiscalização do trabalho. Vale
lembrar que, até 1995, o Brasil se recusava a reconhecer a existência de
trabalho escravo no país. Depois, nós nos tornamos referência para o mundo no
combate à escravidão contemporânea. Isso não pode ser perdido- Guilherme
Feliciano
Já o Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais do Trabalho (SINAIT)
defendeu a manutenção do Ministério do Trabalho por sua importância no cenário
nacional.
Em nota, o presidente do SINAIT, Carlos Silva, diz que "é preocupante
que a declaração de extinção do Ministério do Trabalho não venha acompanhada de
detalhes sobre os desdobramentos de acomodação dos serviços prestados à
sociedade brasileira pela Pasta, especialmente quanto à unidade das atribuições
da Auditoria-Fiscal do Trabalho, espinha dorsal do Ministério do Trabalho".
Quem vai cuidar dos recursos de R$ 1 trilhão do FGTS e FAT?
Segundo o presidente da Anamatra, Guilherme Feliciano, há ainda muitas
perguntas a serem respondidas sobre como seriam geridos os recursos do Fundo de
Amparo ao Trabalhador (FAT) e do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).
Feliciano lembra que esses recursos somam aproximadamente R$ 1 trilhão e
é preciso saber qual órgão vai cuidar e de que forma serão geridos.
"A possível divisão prejudicará a convergência dessas políticas",
ponderou Guilherme Feliciano lembrando que o Ministério do Trabalho atualmente
realiza a gestão dessas políticas com um foco muito claro: fomento à
empregabilidade e às políticas públicas de tendência social.
"Há diversas políticas públicas que estão sendo implementadas atualmente
e que poderiam ser descontinuadas, como, por exemplo, o microcrédito orientado,
da ordem de 200 milhões, e a recém-regulamentada verba para capital de giro de
micro e pequenas empresas, com cerca de 500 milhões", lembra o presidente da
Anamatra.
Ministério do Trabalho sai em defesa de suas ações
Coincidentemente o Ministério do Trabalho divulgou em seu Portal um balanço das
suas ações nos últimos dois anos, que, segundo o órgão, trouxeram
benefícios ao trabalhador e contribuíram para o desenvolvimento do país.
O balanço foi divulgado nesta quinta-feira (8), um dia após Jair
Bolsonaro anunciar que vai acabar com o órgão.
Fonte: CUT