Dia que marca o início da ditadura de 1964 é data para nunca ser esquecida
Apesar de passadas quase seis décadas, o golpe militar de 1964, que
completa 59 anos n dia 1° de abril, ainda é um assunto que não se tornou apenas
parte da história do país. O fantasma da volta de repressão, durante os últimos
quatros anos, colaborou para manter viva, de um lado, a lembrança daquele tempo
sombrio e violento, como forma de resistência para que nunca mais aconteça e,
de outro, o criminoso clamor da direita fascista no país para que, durante o
governo de Jair Bolsonaro (PL) e depois também, os militares tomassem o poder
de assalto, novamente.
Assim como em 1964, os últimos anos de ascensão do fascismo no Brasil
foram de polarização ideológica com os extremistas de direita minando o
imaginário popular com uma possível ´ameaça comunista´, o que não passava e não
passa ainda de fake news. "A mentira é o que eles usam para fazer o povo odiar
governos populares, como era o de Jango, que pretendia fazer reformas
estruturais com um olhar social", diz a secretária de Políticas Sociais e
Direitos Humanos da CUT, Jandyra Uehara.
Para ela, a eleição de Lula em 2022 e seu novo governo apontam para um
fortalecimento da democracia brasileira, mas ainda assim é preciso estarmos
todos alertas contra grupos que pregam regimes autoritários como forma de
controlar a sociedade.
As heranças da ditadura
Os tempos atuais ainda vivem sob características herdadas daquele
período e grande parte da sociedade talvez não se dê conta, diz Jandyra Uheara.
Por isso, ela reforça, é preciso manter vivo o debate sobre o tema.
"Aquele período ainda esta vivo entre nós e desde a Constituição de
1988, com a redemocratização do país, o papel das Forças Armadas se manteve. A
ingerência e a tutela militar sobre a vida civil permanecem e isso se mostra
pelas relações com as polícias, por exemplo", explica a dirigente, se referindo
à militarização das policias.
A dirigente acrescenta que a falta de punição aos torturadores da
ditadura contribui para que as forças policiais ainda reproduzam o
comportamento violento com torturas nos presídios e repressão à população nas
periferias, entre outras ações.
"Uma das heranças da ditadura é a classe trabalhadora em certa medida
ser tratada como inimigo", ela diz.
Outra herança que se mostrou fato latente durante o governo Bolsonaro
foi a intenção de os militares se fazerem presentes na política. "Em nenhum
país democrático o exército tem papel político. Durante o governo Bolsonaro,
vimos o absurdo de termos mais de oito mil militares em cargos públicos", ela
critica.
Jandyra reforça que o papel do exército é proteger a democracia em ação
política ou interferência em questões sociais. "Não se pode ter um exército
conivente com atos antidemocráticos. O fantasma da ditadura está presente e
prova disso foi a conivência com os acampamentos pedindo intervenção militar,
com anuência de militares com patentes, que culminaram nos ataques do dia 8 de
janeiro aos prédios dos Três Poderes, em Brasília", diz.
Jandyra pontua que todas essas heranças, ainda presentes nos dias de
hoje precisam ser combatidas e é papel da CUT, dos movimentos sindical, sociais
e populares manter esse debate vivo, seja pela pressão a parlamentares para que
legislem sobre esses temas, seja endurecendo contra atos violentos das
polícias, seja pela revogação do artigo 142, mas sobretudo se manifestando e
promovendo atividades que promovam a conscientização por parte da população
sobre os horrores daquele período.
A CUT contra a ditadura
A história da CUT é faz parte da luta pela democracia no Brasil, desde
sua fundação, em 1983, durante o período do regime de exceção, conforme lembra
a vice-presidenta da CUT, Juvandia Moreira.
"A CUT nasceu em pleno regime, com a classe trabalhadora mostrando sua
força, sua organização como forma de resistência e reação à ditadura militar. E
foi um dos pilares da redemocratização do país", ela afirma.
Durante aquele período não havia liberdade de organização e expressão,
sindicatos eram invadidos, sofriam intervenções, diretorias eram cassadas,
trabalhadores e trabalhadoras sofriam perseguições, havia prisões arbitrárias e
tudo em um cardápio que incluía torturas e assassinatos.
Em 2023, ano em que a CUT completa 40 anos, prossegue a dirigente, a
Central continua lutando de forma incansável tanto pela democracia e em defesa
da classe trabalhadora. "Também por cidadania, soberania e justiça social", ela
completa.
Seguimos lutando em defesa da pauta da classe trabalhadora, com a defesa
do pleno emprego com sustentabilidade, justiça social, igualdade e democracia
acima de tudo- Juvandia Moreira
O Brasil foi um dos últimos países que enfrentaram golpes a investigar
os crimes praticados durante os regimes. A Comissão Nacional da Verdade (CNV)
foi instituída por lei em 2011 e é considerada uma vitória dos movimentos
sociais, sindical e das famílias vítimas da ditadura.
"Foi um marco no processo de resgate da história e da busca por
justiça", diz Expedito Solaney, dirigente do Sindicato dos Bancários de
Pernambuco, que à época, como secretário de Políticas Sociais da CUT,
representou a central na CNV e coordenou os trabalhos da Comissão da Memória,
Verdade e Justiça da CUT, cujo objetivo foi apurar os crimes contra
sindicalistas durante a ditadura.
"O movimento sindical foi duramente atacado durante a ditadura. No dia
do golpe em 31 de março de 1964, mais de 500 entidades sindicais em todo o país
foram fechadas, amanheceram o dia com tanques de guerra em frente às sedes.
Dirigentes foram presos, exilados, torturados e milhares de trabalhadores
tiveram suas vidas devastadas", disse Solaney em entrevista ao PortalCUT.
Para o sindicalista, o movimento sindical, movimentos sociais, partidos de oposição e todos aqueles que defendem a democracia devem manifestar total repúdio ao golpe de 1964 e manter na memória a atrocidade que caracterizou o regime, para que nunca mais volte a acontecer.
A data correta
Apesar de o fato ter se consumado no dia 1° de abril, com a deposição do
então presidente João Goulart, o ´golpe de 64´ teve início na noite do 31 de
março daquele ano, quando tropas do Exército Brasileiro saíram de Minas Gerais
e invadiram o Rio de Janeiro, ´inaugurando´ o período da ditadura militar.
"Sabendo que o dia 1° de abril é popularmente conhecido
como o ´dia da mentira´, os militares deram início ao golpe no dia 31 de março
para que a data não lhes causasse nenhum constrangimento ou humilhação. Eles
temiam a ridicularização da situação. Por isso, sempre se referem ao golpe como
uma ´contrarrevolução´ que teve se deu no dia 31 de março", explica o professor
de História e Geografia e ex-diretor-executivo da CUT, Júlio Turra.
Turra explica ainda que que foi na noite do dia 31, pouco antes de se
iniciar a madrugada do dia 1° que as tropas começaram a se movimentar em
direção ao Rio de Janeiro. "Elas deixaram Juiz de Fora por volta das 11h da
noite para por em prática o golpe", diz o professor.
Artigo 142
Na Constituição de 1988, o texto do artigo diz que "As Forças Armadas,
constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições
nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na
disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se
à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de
qualquer destes, da lei e da ordem".
No Congresso Nacional, o deputado federal Carlos Zaratini (PT-SP), vem
tentando viabilizar uma Proposta de Emenda à Constituição que altera o artigo,
delimitando os poderes dos militares.
O parlamentar propõe:
·
retirar do artigo a possibilidade das Operações de Garantia da Lei e da
Ordem (GLO´s);
·
afastar possibilidade de interpretação de que as forças armadas possam
ser um poder moderador acima dos três poderes;
·
admitir que os militares possam participar de operações de defesa civil;
·
proibir a participação dos militares na política.
Fonte: CUT